Estes dias andando pela cidade de Nüremberg, encontrei uma coleção de CDs de Contos de Fadas. Esta coleção apresenta em cada CD os mais conhecidos clássicos contos de diferentes países. Nossa, fiquei encantada!
Não pensei muito e comprei para dar de presente a nossa sobrinha de 11 anos de idade.
Eu realmente tenho uma fascinação por contos, em especial por Chapeuzinho Vermelho e a Alice no país das Maravilhas.
Os Contos de fadas contêm para mim uma grande sabedoria meia que escondida, que podem impressionar profundamente as crianças, por estas não terem um acesso a uma visão de mundo cientifico e técnico dos adultos. E todos estes processos técnicos, físicos e fenômenos naturais serão explicados nos Contos de Fadas por poderes mágicos de um simples " Simsalabim ".
Os contos de Fadas falam, traduzem de forma mágica sobre uma vida interior de cada um de nós, que não são tão bem revelados no nosso dia a dia, permanecendo muitas vezes no nosso inconsciente.
Histórias contadas desde uma princesa muito bem prendada até um lobo que quer devorar tudo. Porem o bem sempre vence o mal.
Os Contos falam de uma vida de sonhos, porem contadas sobre realidades humanas, cheias de experiencias entre luzes e sombras, escondidas nas leituras entre letras, palavras, linhas e simbologias que fascinam não somente as crianças, como também os adultos.
Os Contos de Fadas personificam as forças humanas que podem existir em cada um de nós, tanto para bem, quanto para o mal. Mostram também possíveis soluções para situações de conflitos. Servem como espelhos de nossas experiencias mais interiores, mesmo que sejam cheias de emoções de possíveis medos, desejos, invejas ou solidão.
Quando também ainda crianças, os Contos de Fadas ajudam e facilitam a distinguir a escolha entre o bem e o mal, mesmo que a mente as vezes ainda não capte o significado simbólico dos personagens.
Os contos de Fadas muitas vezes aparecem, são contados em um cenário com atitudes ou escolhas dos personagens, muitas vezes em uma forma cruel, assustadora, ou até mesmo perfeccionista de um mundo perfeito cor de rosa, com bolinhas de sabão.
Estas realidades criadas nos contos de fadas, sendo crueis ou perfeccionistas, ajudam a criar reajustes, confrontos, balanças de valores sociais- pessoais e escolhas de atitudes na vida real do leitor, mesmo sendo ainda criança. Um reajuste de uma realidade de Contos de Fadas e a Vida Real.
Não podemos esquecer que mesmo em passagens crueis da leitura, as crianças não estão sozinhas neste momento, porque as imagens de fantasias associadas ao medo, ainda surgem na mente das crianças em uma ambiente mais seguro, justamente na presença da leitura em voz alta dos pais, pessoas associadas ao amor e confiança, fortalecendo assim também mais estes vínculos.
Os Contos de Fadas tem a magia, mesmo que de forma inconsciente, de acreditar e buscar sempre uma saída, uma vitória e ter a esperança de melhoras em quase todas as situações em nossa vida. Buscando sempre um final feliz e a uma moral da história.
Por Cristiane Kunert.
Ainda no Tema:
Autor: Rachel Martins | rmartins@redegazeta.com.br
Fonte: Gazeta Online
Professor-doutor da USP, José Nicolau Gregorin
Filho, fala sobre a origem dos contos de fadas e rumo que essas
histórias estão tomando nos dias atuais
José Nicolau Gregorin Filho é
Doutor em Letras pela UNESP-Araraquara. É docente da Área de Literatura
Infantil/Juvenil do Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas da
FFLCH/USP, São Paulo. Além disso, é Docente e Coordenador do Programa de
Pós-Graduação em Estudos Comparados de Literaturas e Língua Portuguesa
da FFLCH/USP e Assessor Técnico de Gabinete da Pró-Reitoria de Cultura e
Extensão Universitária da USP. Tem vários artigos e capítulos de livros
publicados no Brasil e no exterior sobre o tema, além de dois livros:
“Literatura Infantil: Múltiplas Linguagens e Formação de Leitores” e
“Literatura Juvenil: Adolescência, Cultura e Formação de Leitores”.
– Partindo-se do princípio que os contos de fadas
tradicionais eram transmitidos oralmente, quando supostamente foram
concebidos, e revelavam o modo de vida daquela época, podemos dizer que
sempre houve uma releitura dessas histórias?
Muito bacana essa observação, pois esse fato é verdadeiro. Quando
os irmãos Grimm coletaram essas histórias, provavelmente elas já tinham
versões diferentes das originais. A comunicação entre os grupos sociais
na época não era tão eficiente, eles viviam praticamente isolados uns
dos outros. Pense nas distâncias! E, claro, a partir do que era contado
aos Grimm, eles também fizeram suas modificações. Então, todas essas
histórias, mesmo as versões que pensamos ser mais próximas do original,
chegaram até nós como uma “colcha de retalhos”.
– Podemos
dizer que as primeiras releituras dos contos de fadas foram feitas por
Charles Perrault e os irmãos Grimm? Eles podem ser considerados os
“autores” dos tradicionais contos de fadas que conhecemos até hoje?
Claro!
Mas vamos pensar que aqueles que fizeram o trabalho de coleta desses
contos, até porque eram linguistas, foram os irmãos Grimm. Importante
lembrar que quando falamos de “contos de fada”, falamos de uma criação
cultural, social e anônima, assim como os contos maravilhosos. Não se
sabe a origem, a não ser que eles surgiram da cultura.
- A expansão dos contos de fadas se deu no momento da
descoberta da palavra impressa, quando essas histórias passaram a ser
conhecidas no mundo todo?
Antes da palavra impressa, os
europeus já viajavam para suas conquistas. Antes do período das grandes
navegações essas histórias se espalharam pelo mundo. Veja que os contos
de fada têm origem com os celtas, isso já implica uma divulgação para
toda a Europa. Os contos maravilhosos têm origem no oriente, veja que
temos mais divulgação aí! Quando os colonizadores chegaram às novas
terras, espalharam essas histórias pela oralidade. Claro que, com a
imprensa, a divulgação foi expandida. Mas veja o quanto essas histórias
viajaram oralmente, é bonito isso, não é?
– Dizem que na
verdade esses contos de fadas foram feitos para os adultos, com
significados até referentes à sexualidade. É verdade?
A
verdade é que na época em que surgiram essas histórias não existia a
infância como conhecemos hoje, existiam crianças e isso é outra coisa.
Infância é uma concepção cultural, que se consolidou principalmente com a
família burguesa no século XIX. Então, essas histórias têm origem nos
mitos, numa época em que o saber não era compartilhado como hoje, ou
seja, os mitos falavam da origem do mundo, dos problemas da existência
humana, da morte, dos perigos, de tudo! Eles eram tratados científicos,
jurídicos, entre outros, e sintetizavam o conhecimento humano. Com a
consolidação da família burguesa, surge a concepção da infância, isto é,
um momento do amadurecimento humano em que se precisa de cuidado, de
escola... Então, foram retirados assuntos como sexo, morte, violência!
(veja que a infância em menos de um século já mudou!). Claro que todas
as questões estão presentes nos contos, pois se passavam conhecimentos
de geração a geração. Veja que, depois, surgiu outra concepção cultural:
a adolescência.
– A partir de que momento foi feito uma releitura - e por que - e eles passaram a encantar as crianças?
Exatamente
pelo que expliquei antes. Dado ao seu teor “pedagógico” e de
“fantasia”. Para atender essa nova concepção cultural, a infância, eles
foram adaptados por já trazerem essas características tão aceitas e
apreciadas desde a “infância” da humanidade.
– Quais os
significados mais expressivos que esses contos de fadas tradicionais
trazem embutidos? O que a criança consegue captar é bem diferente do
adulto?
Para responder a essa questão, devemos pensar
que cada leitor, seja ele criança ou adulto, quando em contato com um
texto literário vai apreender significados diferentes, não é? Costumo
dizer que lemos o que queremos e precisamos para nós mesmos, não o que
está escrito. Claro que depende do narrador que se instaura no texto, de
quais são os pontos que se destacam e daquilo que queremos mostrar,
depende da versão que utilizamos e outras artes como o teatro e o
cinema, que tem feito isso muito bem, veja os sucessos dos últimos
tempos!
– Foi a partir do momento que passaram a fazer
parte do universo infantil que surgiu a velha "moral da história" que
todos eles trazem? Qual o objetivo disso na época?
Sempre
que lemos um texto, buscamos seu sentido, o que ele quer nos dizer?
Fazemos isso com a arte de um modo geral, fazemos isso com as pessoas,
suas roupas... Estamos sempre perguntando, o que isso quer dizer? Claro
que naquela época ancestral, acredito que eles queriam dizer: Como
sobreviver a isso? Como ultrapassar essa floresta escura? Quais os
perigos que existem do lado da minha aldeia? O que é bom para mim e para
os outros? Que formas a maldade pode assumir? Veja que as questões não
mudaram tanto, não é?
– Podemos afirmar que esses contos
de fadas tradicionais se universalizaram com as produções dos estúdios
Disney? Qual foi a releitura das histórias contadas por Disney em
relação às de Perrault, irmãos Grimm, e outros?
Ah,
veja que antes disso a coisa já havia tomado proporções gigantescas! Mas
a Disney fez lá as suas versões como convinha, adocicando tudo com sus
princesas loiras e seus castelos de sonho e, infelizmente, o que o mundo
assimilou foi isso! É importante lembrar que numa das primeiras versões
de Cinderela ela vai a uma missa, não a um baile, por isso ela
precisava estar bem arrumada, pois a nobreza ficava próxima do altar,
enquanto que os mais pobres ficavam longe, senão fora das igrejas. Por
isso o nome Cinderela, vem de cinzas. Como ela iria falar com o
príncipe? Isso se tornou uma história de amor, mas eu, assim como outros
estudiosos que fizeram parte da minha formação, concordam que é uma
questão de ascensão social. Há boas publicações que trazem esses contos
mais próximos dos supostos originais.
– Na sua visão, com a chegada dos contos de fadas no cinema, eles se popularizaram muito mais?
Acredito
que sim, depende de toda uma estrutura para isso: família, escola, etc.
Mas o texto não deve terminar na sala de cinema, o assunto deve
continuar e motivar as pessoas a buscarem outras versões, a conversarem
sobre literatura, a buscarem as fontes desses filmes.
–
Os contos de fadas da Disney eram maniqueístas? Mostravam de forma bem
clara quem fazia parte do bem e quem fazia parte do mal, portanto, quem
deveríamos amar, e quem deveríamos odiar?
Claro que são
maniqueístas e tratavam assim o bem e o mal. Verifique que, em várias
histórias, os “bonzinhos” são os bonitos, os loiros de olhos azuis, e
assim por diante! Veja que as bruxas sempre eram colocadas como mulheres
velhas e feias! Acho que isso está mudando com as novas versões para o
cinema. Nelas, atrizes que correspondem ao padrão de beleza exposto na
mídia são as bruxas.
– Me parece que nas releituras
contemporâneas os papéis de muitos personagens têm se invertido. Agora,
muitas vezes, o vilão é mais amado que o mocinho? O que está acontecendo
na sociedade que está abrindo as portas para essa nova maneira de expor
os tradicionais contos de fadas?
Bem observado! A
sociedade está realmente mudando! Isso é a inversão social e as crianças
estão no meio disso! Lembra o que eu falei de infância anteriormente?
Com essa sua observação, parece que a infância mudou e que aqueles temas
que contribuíram para a criação dessa concepção são assuntos que fazem
parte de sua realidade. Veja como os contos estão presentes na sociedade
e vão se modificando, assim como a própria sociedade...
–
Essas mudanças são uma forma de humanizar mais esses personagens? Quer
dizer, a madrasta não é tão má? Afinal, todos podemos ser bons e ruins,
dependendo da situação?
Esse é o lado bom dessas
transformações e elas acontecem em razão de a sociedade de hoje ter uma
moral mais relativa. Essas histórias, hoje, mostram que todos podem ter
várias facetas no seu caráter e que as aparências podem enganar (para
usar um lugar-comum!). Isso só acontece pelo vínculo que essas histórias
têm com a sociedade, com o imaginário, – aqui chamo de imaginário o
arquivo cultural das sociedades. Se não estivessem tão presentes no
imaginário será que elas poderiam ser resgatadas com tanta facilidade?
–
Nos contos de fadas tradicionais o papel do homem dominante, e da
mulher dominada, ficava claro. Hoje, as mulheres são mais independentes e
não estão mais à espera do príncipe encantado. Mas mesmo assim ainda
aparecem nas novas versões dependendo dos homens para fazê-las felizes.
Quer dizer que nem tudo é modificado?
Será? Observe que
os contos de fadas nos dizem de questões subjetivas, interiores. A
mulher está mais independente no que diz respeito ao trabalho, mas veja
que o homem está mais frágil com a presença dessa nova mulher. Será que
se não vivêssemos ainda parte desse universo as redes sociais estavam
tão repletas de “princesas” e “príncipes”? Isso é complicado e às vezes
observamos o mundo com os olhos de alguém que vive em grandes centros
cosmopolitas. Há vários mundos, interiores e exteriores. Isso que você
falou também é estereótipo, veja a publicidade! Ela ainda trabalha com
esses mitos, com algumas alterações.
– Apesar das mudanças, é fácil identificar nas releituras contemporâneas a que conto de fadas essa nova história pertence?
Claro!
Inclusive quando há “misturas” de histórias. Vou pegar um exemplo muito
fácil que não é nem de conto de fadas, mas ilustra bem! A versão da
Disney de “Alice no País das Maravilhas” traz elementos da obra do mesmo
nome e de outra – “ As aventuras de Alice através do espelho”. Ambas de
Carroll. Mas é importante pensar que todos os textos dialogam na
sociedade, todos guardam relações entre si. O que importa é levar às
crianças uma quantidade de textos para que elas façam essas associações.
Isso é um leitor competente!
– Quais são os novos
significados que a sociedade quer passar para as crianças e jovens com
essas releituras contemporâneas, onde, por exemplo, Chapeuzinho Vermelho
tem uma filha com o Lobo Mal, ou um ogro é o herói da história?
Honestamente
não sei! Há uma necessidade do “politicamente correto” e de subversões
aos textos para atender ao mercado. Não sei mesmo! Veja que existem até
teses sobre o tema de Chapeuzinho Vermelho e sua relação com o
comportamento da mulher na sociedade, seus medos, etc. Há versões que
não divulgo porque acredito que não tragam vantagens nem literárias nem
comportamentais.
– Por que mesmo nessas releituras as metamorfoses, a magia, a fantasia, o sobrenatural, ainda sobrevivem?
Isso sempre vai sobreviver, principalmente em tempos difíceis. Então, acho que agora mais do que nunca! (risos).
– Essas releituras contemporâneas podem jogar para escanteio as versões clássicas?
Como eu já mencionei, depende de quem oferece e divulga essas novas
versões à sociedade e em última análise às crianças. Prefiro acreditar
que elas instigam a procurar a origem, fazem ler mais... Trabalho para
isso, inclusive.
- Qual a importância dos contos de fadas
na infância para a formação do indivíduo, partindo do princípio que
eles sempre trazem uma mensagem por trás, tanto os tradicionais, como os
contemporâneos?
Antes de tudo, a leitura sempre é
fundamental para a formação do individuo. Dizer que a literatura não
ensina, que se deve apenas buscar o entretenimento pelo entretenimento,
isso não existe! Mas sobre os contos de fada, especificamente, talvez a
sua importância seja trabalhar com temas tão complexos de maneira a
fazer a fantasia e o maravilhoso se sobreporem, chamarem a atenção. Eles
sempre falarão de problemas humanos, sempre!
- Hoje, com
as crianças e jovens cada vez mais virtuais, você acha que ler os
contos de fadas no computador, nos smartphones e nos tablets, muitas,
inclusive, são animadas, acarreta na perda de qualidade. Ou o que vale é
ler, não importa o veículo?
Sobre essa questão da
leitura em outros suportes, não acho que atrapalhe. A criança está em
contato com esses aparelhos e mídias, não há como fugir. O problema é
que os adultos, daí eu coloco mais os pais do que os professores, devem
sempre incentivá-las a buscar também outras leituras, em outros
suportes. Há adaptações muito legais online, como, por exemplo, a
história de "Chapeuzinho Vermelho" no site da Ângela Lago. Apesar de ser
supercriativo e legal, ele incentiva a criança a buscar a história
tradicional. Se pensarmos a fundo, hoje até a leitura virtual é uma
mistura de todas as formas que a humanidade utilizou para esse fim. Há
aspectos do “rolo”, que você desenrola o texto no tablet. Ou as páginas
mesmo - essa não seria uma evolução dos tabletes da Biblioteca da
Babilônia? Acho que é legal ser plural, plural nos suportes de leitura e
plural nos textos, só assim seremos leitores plurais.
- Entrevista original neste Site.
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